Li hoje este poema de Pedro Tamen que ele dedicou a Mário Murteita:
Adam Smith
Onde mete você a moral,meu caro amigo,
repetiam ao professor escocês, que sob a saia
ocultava segredos que já sabia resolver.
Teólogo e natural, como o Adão,
ele cria nos homens, pobrezinho,
e tudo viria por acréscimo, derramado dos dedos do boneco, de um boneco no mundo.
Perto do fim da vida, pelos sessenta e sete,
ficou talvez sabendo que buscar o secreto
é que demais importa,ah,muito mais
que saber resolvê-lo. E que no mundo
não há boneco, cuco de relógio
que diga a hora onde não há hora certa.
novembro 30, 2006
novembro 26, 2006
Eu trabalho, tu...
Os portugueses quando se chateiam com alguém gostam de lhe chamar malandro e de o mandar trabalhar. Isso porque, ou se acham os únicos que trabalham ou então, como não o fazem, consideram que todos são iguais a si.
Foi-me sempre difícil explicar a algumas dessas pessoas como é que o meu horário de 35 horas de trabalho era preenchido. Eu lá ia dizendo : tenho catorze horas de trabalho lectivo, por semana, duas horas no mínimo, por dia, de preparação dessas aulas, o que faz umas doze horas. Sobram nove horas. Nessas restantes horas pode haver reuniões, tarefas de direcção de turma. Isto não os convencia. Acabava por falar no desgaste próprio de uma profissão em que se está sempre exposto e a gerir relações com crianças. Nada. Por fim argumentava: mas se a minha profissão é tão boa e tão bem paga, atendendo ao pouco que trabalho, porque não trocas tu de profissão e te tornas professor. Aí a resposta: isso nunca! Não percebia,mas já percebo. O problema era alguma liberdade de que dispunha para gerir esse tempo, agora como já não a tenho, sou como eles - e estão felizes.Não interessa mais nada.
novembro 18, 2006
O escravo de Ménon
Há uma parte do diálogo entre Ménon e Sócrates que acho especialmente curiosa. Quando este procura provar que "aquilo a que chamamos aprender não é mais do que recordar" chamando um escravo de Ménon para mostrar o que pensa.
Uma verdadeira "aula".
A partir de um desenho, possivelmente no chão, na areia, de um quadrado de dois pés de comprimento, Sócrates coloca ao escravo a questão de quanto terá de comprimento o lado de um quadrado cuja área seja dupla da área do primeiro.
- É evidente, Sócrates que terá o dobro (...)
- Dizes que o espaço duplo se forma da linha dupla? Repara bem: não me refiro a um espaço comprido deste lado e curto daquele, pretendo uma superfície como esta, igual em todos os sentidos mas que tenha uma extensão dupla, ou seja de oito pés. Ainda pensas que se forma sobre a linha dupla? (...) Se acrescentarmos a esta linha do mesmo comprimento a nova linha não será dupla da primeira? Tracemos então quatro linhas semelhantes a esta, chamas a isto um espaço de oito pés?
- Sim.
- Mas este novo quadrado não compreende outros quatro, cada um dos quais é igual ao primeiro, que mede quatro pés?
- Sim.
- Então qual é a grandeza dele? Não é quatro vezes maior?
- Sem dúvida.
- Mas o que é quatro vezes maior é duplo?
- Nao,por Zeus!
- Então o que é?
- É quádruplo.
- Portanto, meu rapaz, com a linha dupla não se forma um espaço duplo, mas sim quádruplo.
- É verdade.
- Quatro vezes quatro não são dezasseis?
- Sim.
O diálogo prossegue acabando o escravo por chegar à conclusão de que a linha que leva à área dupla tem que ser maior que dois pés e menor que quatro pés. E admitindo que não sabe a resposta.
Sócrates remata:
- Viste, Ménon,o percurso que ele fez no caminho da reminiscência? A príncipio, sem saber qual é o lado do quadrado de oito pés (e ainda não o sabe) julgava sabê-lo e respondia com segurança, como se o soubesse, sem suspeitar da sua ignorância. Agora, já avalia a dificuldade, embora não saiba, ao menos já não supõe que sabe.(...)
facilitamos-lhe a marcha para descobrir a verdade, porque daqui em diante, embora não o saiba, terá o prazer de investigar, ao passo que anteriormente, não vacilava em afirmar e repetir perante uma multidão, com inteira confiança, que o duplo de um quadrado se forma sobre o dobro do lado.
Por vezes quase me sinto qual Sócrates à espera que os meus alunos encontrem alguma reminiscência das suas vidas passadas, falta-me é a sua arte.
Uma verdadeira "aula".
A partir de um desenho, possivelmente no chão, na areia, de um quadrado de dois pés de comprimento, Sócrates coloca ao escravo a questão de quanto terá de comprimento o lado de um quadrado cuja área seja dupla da área do primeiro.
- É evidente, Sócrates que terá o dobro (...)
- Dizes que o espaço duplo se forma da linha dupla? Repara bem: não me refiro a um espaço comprido deste lado e curto daquele, pretendo uma superfície como esta, igual em todos os sentidos mas que tenha uma extensão dupla, ou seja de oito pés. Ainda pensas que se forma sobre a linha dupla? (...) Se acrescentarmos a esta linha do mesmo comprimento a nova linha não será dupla da primeira? Tracemos então quatro linhas semelhantes a esta, chamas a isto um espaço de oito pés?
- Sim.
- Mas este novo quadrado não compreende outros quatro, cada um dos quais é igual ao primeiro, que mede quatro pés?
- Sim.
- Então qual é a grandeza dele? Não é quatro vezes maior?
- Sem dúvida.
- Mas o que é quatro vezes maior é duplo?
- Nao,por Zeus!
- Então o que é?
- É quádruplo.
- Portanto, meu rapaz, com a linha dupla não se forma um espaço duplo, mas sim quádruplo.
- É verdade.
- Quatro vezes quatro não são dezasseis?
- Sim.
O diálogo prossegue acabando o escravo por chegar à conclusão de que a linha que leva à área dupla tem que ser maior que dois pés e menor que quatro pés. E admitindo que não sabe a resposta.
Sócrates remata:
- Viste, Ménon,o percurso que ele fez no caminho da reminiscência? A príncipio, sem saber qual é o lado do quadrado de oito pés (e ainda não o sabe) julgava sabê-lo e respondia com segurança, como se o soubesse, sem suspeitar da sua ignorância. Agora, já avalia a dificuldade, embora não saiba, ao menos já não supõe que sabe.(...)
facilitamos-lhe a marcha para descobrir a verdade, porque daqui em diante, embora não o saiba, terá o prazer de investigar, ao passo que anteriormente, não vacilava em afirmar e repetir perante uma multidão, com inteira confiança, que o duplo de um quadrado se forma sobre o dobro do lado.
Por vezes quase me sinto qual Sócrates à espera que os meus alunos encontrem alguma reminiscência das suas vidas passadas, falta-me é a sua arte.
novembro 16, 2006
Um filme
Foi um filme que vi na década de sessenta e não voltei a ver. Não sei o que sentiria se o visse agora, mas na altura gostei. Quando o vi estava perdidamente apaixonada.Conservo uma ideia de um filme lindo, muito colorido e todo ele cantado ( música de Michel Legrand). Não era só uma espécie de conto de fadas que corre mal, ou bem, dependendo do ponto de vista,tinha em si uma espécie de encantamento. Não era apenas uma história de amor. Levantava problemas que na altura eram importantes: a guerra da Argélia e os traumas e desfasamento social que sofrem os que regressam, a juventude, o romance ,o casamento, a pressão convencional da sociedade, as escolhas. Chamava-se Les parapluies de Cherbourg, de Jacques Demy com Catherine Deneuve-resplandecente.
novembro 09, 2006
Matemática
Não sei dizer quando é que comecei a gostar de matemática.Mas desde pequena que gostava de números e problemas que ia fazendo com o meu pai. No liceu nunca tive nenhum professor extraordinariamente motivador. O insucesso em matemática era grande.Poucos tinham positiva. Nessa altura, como hoje, a matemática era um factor de selecção.No entanto, gostava do meu professor,o dr. Subtil, devo ter tido outros, mas só me lembro deste. As turmas não eram mistas até ao 5ºano (actual 9º). Esse professor gozava connosco,mulheres, mandáva-nos para casa, onde devia ser o nosso lugar, a coser meias e a prepararmo-nos para ser boas esposas- o que nunca seríamos se não soubessemos matemática. Eu achava-lhe graça e ele parecia rir-se do que dizia, provocáva-nos.
Era a minha aula preferida.Na faculdade detestei, reconheço que os professores faziam aqui os possíveis para irmos mesmo para casa e não tinham graça.
Mas foi mais tarde, quando deixei de estudar por obrigação escolar que descobri mesmo a beleza da matemática: Quando tive que a estudar para a ensinar.
Era a minha aula preferida.Na faculdade detestei, reconheço que os professores faziam aqui os possíveis para irmos mesmo para casa e não tinham graça.
Mas foi mais tarde, quando deixei de estudar por obrigação escolar que descobri mesmo a beleza da matemática: Quando tive que a estudar para a ensinar.
novembro 07, 2006
Faz anos
O único partido em que militei extinguiu-se faz hoje vinte e cinco anos num jantar de encerramento das actividades.O facto foi-me lembrado pela blogosfera. É curioso acabar um partido desta maneira: éramos um pouco diferentes do habitual. Muitos já desapareceram para sempre, outros nunca mais os vi, alguns lamento não ter conhecido melhor,nem os nomes conheci, outros não me interessou conhecer. De alguns ainda sou amiga,alguns ainda encontro regularmente. Não sou saudosista mas foi um período que me marcou.
novembro 05, 2006
Um modelo matemático
A Matemática está em todo o lado. Ninguém duvida. Até serve para melhorar os Serviços de Urgência Hospitalar.Ver
Existe este homem?
Amar e ser amado
Homem de negócios, abastado, bem sucedido, alemão,1,87m, na casa dos 60, não fumador, católico, procura senhora atenciosa, de estilo refinado, atraente, elegante, culta, inteligente( entre os 30 e os 40 anos), de boas famílias, charmosa e bondosa). Vem apreciar comigo as coisas belas do mundo (não está excluído o desejo comum de ter filhos).Os meus atributos: activo, excelente condição física, atraente, generoso, crítico, com várias áreas de interesse, cosmopolita e viajado. Sinto-me fascinado pelo mar, pela natureza, pela arte e pela arquitectura. Vem apreciar as belezas deste mundo nas minhas mansões de sonho em Lugano(Suiça) em Tenerife e na Costa Rica (na Costa do Pacífico). Mas também estou aberto a outras possibilidades, desde a vida numa quinta, até à vida numa metrópole com alma.
Isto é um anúncio que vinha no Público, em Português e inglês. Seguia-se o pedido às interessadas de carta com foto de corpo inteiro e número de telefone a enviar para um endereço na Alemanha.
Este partido de sonho não arranja mulher? O caso devia ser investigado.
Homem de negócios, abastado, bem sucedido, alemão,1,87m, na casa dos 60, não fumador, católico, procura senhora atenciosa, de estilo refinado, atraente, elegante, culta, inteligente( entre os 30 e os 40 anos), de boas famílias, charmosa e bondosa). Vem apreciar comigo as coisas belas do mundo (não está excluído o desejo comum de ter filhos).Os meus atributos: activo, excelente condição física, atraente, generoso, crítico, com várias áreas de interesse, cosmopolita e viajado. Sinto-me fascinado pelo mar, pela natureza, pela arte e pela arquitectura. Vem apreciar as belezas deste mundo nas minhas mansões de sonho em Lugano(Suiça) em Tenerife e na Costa Rica (na Costa do Pacífico). Mas também estou aberto a outras possibilidades, desde a vida numa quinta, até à vida numa metrópole com alma.
Isto é um anúncio que vinha no Público, em Português e inglês. Seguia-se o pedido às interessadas de carta com foto de corpo inteiro e número de telefone a enviar para um endereço na Alemanha.
Este partido de sonho não arranja mulher? O caso devia ser investigado.
novembro 04, 2006
Grátis
Dizia Stephen Kanitz na Veja de 25 de Outubro:
Somos essa sociedade atrasada porque, entre nós, cobrar caro, ganhar mais do que os outros é malvisto pelos nossos intelectuais, políticos,líderes religiosos e professores de sociologia. O paradigma de sucesso deles é cobrar pouco. Melhor ainda seria não cobrar, oferecendo de graça ensino,saúde,segurança,cultura,aposentadorias, remédios, comida, dinheiro,enfim. De graça, o povo não tem como reclamar dos péssimos serviços, os alunos desses professores não têm como criticar as péssimas aulas. "De cavalo dado não se olham os dentes". Se alguma coisa a história nos ensina é que o "tudo grátis" traz consigo a queda da qualidade dos serviços públicos, a desvalorização do serviço, o desprezo pelo povo nas filas, a exclusão social, a corrupção e a desmoralização de todos os envolvidos.
Mais adiante:
Nós administradores já descobrimos há tempos que refeições grátis para funcionários não são valorizadas, e a qualidade despenca. Por isso, cobramos algo simbólico, 10% a 20% de seu valor. Se o ensino fosse cobrado, em pelo menos 10% do valor, teríamos pais de alunos reclamando do péssimo ensino público e gerando pressão por melhoria e redução de custos.
E ainda
Precisamos mudar a mentalidade deste país, uma mentalidade que incentiva a mediocridade, e o medo de cobrar pelos serviços, por óbvias razões.
Bem, isto é no Brasil mas a mentalidade não é assim tão diferente da nossa.
Somos essa sociedade atrasada porque, entre nós, cobrar caro, ganhar mais do que os outros é malvisto pelos nossos intelectuais, políticos,líderes religiosos e professores de sociologia. O paradigma de sucesso deles é cobrar pouco. Melhor ainda seria não cobrar, oferecendo de graça ensino,saúde,segurança,cultura,aposentadorias, remédios, comida, dinheiro,enfim. De graça, o povo não tem como reclamar dos péssimos serviços, os alunos desses professores não têm como criticar as péssimas aulas. "De cavalo dado não se olham os dentes". Se alguma coisa a história nos ensina é que o "tudo grátis" traz consigo a queda da qualidade dos serviços públicos, a desvalorização do serviço, o desprezo pelo povo nas filas, a exclusão social, a corrupção e a desmoralização de todos os envolvidos.
Mais adiante:
Nós administradores já descobrimos há tempos que refeições grátis para funcionários não são valorizadas, e a qualidade despenca. Por isso, cobramos algo simbólico, 10% a 20% de seu valor. Se o ensino fosse cobrado, em pelo menos 10% do valor, teríamos pais de alunos reclamando do péssimo ensino público e gerando pressão por melhoria e redução de custos.
E ainda
Precisamos mudar a mentalidade deste país, uma mentalidade que incentiva a mediocridade, e o medo de cobrar pelos serviços, por óbvias razões.
Bem, isto é no Brasil mas a mentalidade não é assim tão diferente da nossa.
novembro 01, 2006
Deve haver engano
Olho sempre com desconfiança para os títulos da primeira página dos jornais. Não sou só eu. O António Barreto no domingo passado, no Público dizia a certa altura a propósito:
..."Como engano deve haver nas notícias que nos dizem que a ministra quer que os professores cumpram oito horas de aulas por dia. Oito vezes cinco dias, temos quarenta horas de aulas por semana. A que se devem acrescentar as horas de reunião de turma e de escola, as horas de recepção de alunos e pais, as horas de revisão de testes e de exames, as horas de substituição de professores e as horas de acompanhamento de estudo e trabalho, sem esquecer evidentementa as horas de preparação de aulas. Pensar que isto é possível ou que deve ser feito releva de uma mente definitivamente descolada da realidade. Desafio qualquer ser humano a cumprir este horário! Creio que nem sequer vale a pena fazer mais contas ou argumentar. Não quero acreditar. Deve haver engano."
Cá para mim isto só pode ser o reconhecimento da ministra de que somos geniais e com infinitas capacidades de resposta e de trabalho. Admita senhora ministra.
..."Como engano deve haver nas notícias que nos dizem que a ministra quer que os professores cumpram oito horas de aulas por dia. Oito vezes cinco dias, temos quarenta horas de aulas por semana. A que se devem acrescentar as horas de reunião de turma e de escola, as horas de recepção de alunos e pais, as horas de revisão de testes e de exames, as horas de substituição de professores e as horas de acompanhamento de estudo e trabalho, sem esquecer evidentementa as horas de preparação de aulas. Pensar que isto é possível ou que deve ser feito releva de uma mente definitivamente descolada da realidade. Desafio qualquer ser humano a cumprir este horário! Creio que nem sequer vale a pena fazer mais contas ou argumentar. Não quero acreditar. Deve haver engano."
Cá para mim isto só pode ser o reconhecimento da ministra de que somos geniais e com infinitas capacidades de resposta e de trabalho. Admita senhora ministra.
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