novembro 26, 2006

Eu trabalho, tu...

Os portugueses quando se chateiam com alguém gostam de lhe chamar malandro e de o mandar trabalhar. Isso porque, ou se acham os únicos que trabalham ou então, como não o fazem, consideram que todos são iguais a si.
Foi-me sempre difícil explicar a algumas dessas pessoas como é que o meu horário de 35 horas de trabalho era preenchido. Eu lá ia dizendo : tenho catorze horas de trabalho lectivo, por semana, duas horas no mínimo, por dia, de preparação dessas aulas, o que faz umas doze horas. Sobram nove horas. Nessas restantes horas pode haver reuniões, tarefas de direcção de turma. Isto não os convencia. Acabava por falar no desgaste próprio de uma profissão em que se está sempre exposto e a gerir relações com crianças. Nada. Por fim argumentava: mas se a minha profissão é tão boa e tão bem paga, atendendo ao pouco que trabalho, porque não trocas tu de profissão e te tornas professor. Aí a resposta: isso nunca! Não percebia,mas já percebo. O problema era alguma liberdade de que dispunha para gerir esse tempo, agora como já não a tenho, sou como eles - e estão felizes.Não interessa mais nada.

1 comentário:

Maria Lisboa disse...

Sim. Eles estão felizes... e nós infelizes. Não porque trabalhemos mais horas, mas sim porque nos burocratizaram uma profissão que não o pode nem o deve ser. Tornaram-nos funcionários públicos na verdadeira acepção da palavra... e a educação não se coaduna com esse estatuto.
Não nos perceberam... não perceberam o contexto em que trabalhamos... quem vai perder é a educação.
Se fossemos sensatos até trabalhariamos menos, atendendo ao "mapa" que nos traçaram. O que não ficasse feito nas horas que nos destinaram para cada parte da nossa função, ficaria por fazer, seria feito quando houvesse tempo. Mas nós "somos parvos"... ao contrário de todos os epítetos com que nos brindaram, até temos a mania de trabalhar, habituámo-nos a tentar fazer tudo para resolver os problemas dos putos, habituámo-nos a fazer materiais (custe o que custe) para os prender, habituámo-nos a querer ter tudo pronto para eles. (In)felizmente vai demorar muito tempo até que nos tornemos mesmo FPs (a sigla dá mesmo para os dois lados! :))