A minha relação com a religião,desde que me lembro, foi sempre conflituosa.A ideia da existência de um Deus sempre presente ,conhecedor de todos os meus pensamentos e gestos,mais! sabendo até o que eu ia fazer a seguir embora me desse a liberdade de escolher, aterrorizava-me. Não conseguia viver se acreditasse nisso. Entrar numa igreja era a coisa mais desagradável que me podiam obrigar a fazer. Aquelas imagens todas, estáticas, a olhar para mim eram um símbolo de sofrimento e morte que me angustiava. Com o tempo fui racionalizando a questão , mas ainda hoje me é difícil entrar numa igreja, ao contrário de muita gente que se sente calma nesse silêncio, eu só penso em fugir :sinto um peso sobre mim, sinto-me oprimida. Mas de todas as recordações da minha infância, as piores prendem-se com a Páscoa. Toda essa história de morte e ressurreição, todo esse ritual deprimente: a via sacra, as igrejas vestidas de roxo e culminando com uma visita ao Calvário - uma igreja- onde uma enorme estátua, sobre-humana com o seu ar arrepiante esperava a nossa visita e o beija-pé, era demais para o imaginário interrogativo da criança racional que eu era. Acho que começou aí a minha doença do cólon irritável.
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